domingo, 9 de junho de 2019

Sol Poente


E então me perguntei:
Qual é o meu lugar neste mundo?
E a resposta, eu sei:
É exatamente onde me coloquei

A real idade
Da minha realidade
É fácil de calcular:
Desde o dia em que nasci
Até quando te conheci

Este é o meu devido lugar
No mundo em que estou:
No meio da multidão
Cercado de vazio e de não.

No espelho do meio da minha morada
Eu vejo ficando pra trás minha estrada
Me pediram pra manter meus pés no chão
E eu respondi um sonoro não!

Desculpe, mais uma vez estou indo embora
A diferença é que, agora,
Não tracei a direção nesta via de uma mão:
O que me guia é o sol-poente, rumo à escuridão.


Calixto John
8/6/2019



Importante!

Você pode copiar e redistribuir todo o conteúdo do meu blog e demais redes sociais que participo, desde que concorde com o seguinte:
-Não altere o conteúdo 
dos textos de nenhuma forma, nem reproduza apenas "partes" deles;
-Não venda, alugue ou obtenha privilégios lucrativos distribuindo meu conteúdo sem a devida autorização;
-Inclua esta nota de direitos autorais e também, no final, o link abaixo:


© Calixto_john, João Calixto Neto, Ed. Ateniense, São Paulo
Todos os direitos reservados de acordo com a legislação vigente
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação(CIP)
(CBL)Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil: Calixto, João Neto CDD 869.915
FBN - Fundação Biblioteca Nacional: ISBN 978-85-330-0019-7

Um comentário:

Marcos Antônio Calixto disse...

John!
Parabéns pelo seu blog...

Tudo que vivemos parece um grande deserto...


Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.

Não são algumas toneladas de pedras ou tijolos ao alto

Que disfarçam o solo, o tal solo que é tudo.

Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes —

Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas,

Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu.

Grandes são os desertos, minha alma!

Grandes são os desertos.

Não tirei bilhete para a vida,

Errei a porta do sentimento,

Não houve vontade ou ocasião que eu não perdesse.

Hoje não me resta, em vésperas de viagem,

Com a mala aberta esperando a arrumação adiada,

Sentado na cadeira em companhia com as camisas que não cabem,

Hoje não me resta (à parte o incómodo de estar assim sentado)

Senão saber isto:

Grandes são os desertos, e tudo é deserto.

Grande é a vida, e não vale a pena haver vida.

Arrumo melhor a mala com os olhos de pensar em arrumar

Que com arrumação das mãos factícias (e creio que digo bem).

Acendo o cigarro para adiar a viagem,

Para adiar todas as viagens.

Para adiar o universo inteiro.

Volta amanhã, realidade!

Basta por hoje, gentes!

Adia-te, presente absoluto!

Mais vale não ser que ser assim.

Comprem chocolates à criança a quem sucedi por erro.

E tirem a tabuleta porque amanhã é infinito.

Mas tenho que arrumar a mala,

Tenho por força que arrumar a mala,

A mala.

Não posso levar as camisas na hipótese e a mala na razão.

Sim, toda a vida tenho tido que arrumar a mala.

Mas também, toda a vida, tenho ficado sentado sobre o canto das camisas empilhadas,

A ruminar, como um boi que não chegou a Ápis, destino.

Tenho que arrumar a mala de ser.

Tenho que existir a arrumar malas.

A cinza do cigarro cai sobre a camisa de cima do monte.

Olho para o lado, verifico que estou a dormir.

Sei só que tenho que arrumar a mala,

E que os desertos são grandes e tudo é deserto,

E qualquer parábola a respeito disto, mas dessa é que já me esqueci.

Ergo-me de repente todos os Césares.

Vou definitivamente arrumar a mala.

Arre, hei-de arrumá-la e fechá-la;

Hei-de vê-la levar de aqui,

Hei-de existir independentemente dela.

Grandes são os desertos e tudo é deserto,

Salvo erro, naturalmente.

Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado!

Mais vale arrumar a mala.

Fim.

4-10-1930
Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1944 (imp. 1993). - 43.